santo antônio — aracaju — sergipe

Victor Ramos
3 min readJun 13, 2020

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Que seria de mim meu deus, sem a fé em Antônio? Se pergunta Bethânia e discorre em um canto cheio de fé e afeto sobre o querido santo, e nesse canto eu viajo embalado pela devoção a Antônio.
Embarco num mundo de memórias, volto a um lugar quentinho e acolhedor, com cheiro de milho, canjica e bolo de leite, com sons de fogos de artifício e pontilhado do brilho das fogueiras. Volto aos junhos da minha infância em que as comemorações para seu Antônio abriam não só os festejos juninos como também as tão esperadas férias.
E não era festa pouca não! no bairro que leva o nome do tão querido santo os festejos começavam cedo, e logo todas as ruas eram preenchidas pelo alvoroço, nem parece que aquele senhor simpático carregando um menino deus nos braços poderia causar tantas emoções em seus fiéis adoradores.
Logo que despertava o primeiro dia do mês consagrado a ele, as mulheres solteiras faziam plantão em sua paróquia, as simpatias corriam solta de boca a boca, era um tal de colocar o santo de cabeça pra baixo, tirar o menino do colo e até colocar o coitado dentro da geladeira, vê se pode?! Nas conversas da porta de casa dava para ouvir de todo tipo de castigo que o santo levava, tadinho, passando por tanto perrengue só restava atender aos pedidos de amor, e aí era outro falatório sem fim!
Quem era atendido pelo santo logo fazia questão de desfilar pelas ruas, era pra provocar inveja mesmo, tem que mostrar pra todo mundo as proezas de Antônio. E o casamento? Claro que era marcado na paróquia do responsável pela união, e o dia tinha que ser o dos namorados que vem antes do dia do santo. E aí o bairro inteiro a jogar arroz nos casais ao sair da igreja em direção a felicidade da lua de mel, mas antes, claro, o agrado ao santinho.
Os solteiros, ainda mantendo seu antônio preso na geladeira, pra ter uma garantia maior ó lá o nome escrito na barra do vestido da noiva, é pra dá uma ajudinha pro santo, simpatia nunca é demais.
Mas a coisa que animava mesmo o bairro inteiro era quando chegava o dia dele, o treze de junho, o bairro já amanhecia com os fogos explodindo nos céus acordando os dorminhocos logo cedo. A igreja dele já lotava na primeira missa e olha que durante o dia ainda tinha muitas outras.
Os pãezinhos bentos desciam a colina, morada oficial de Antônio, e circulavam por todas as ruas do bairro santo, consagrando todas as casas. “Menino coloca isso no pote de farinha que é pra ter prosperidade o ano todo!” E era assim em todas as casas, abria o pote de farinha, encontrava o pãozinho bento, era até estranho quando não via. E a procissão menino? nem te conto! Era uma festa e a criançada correndo e cantando atrás do santo, as ruas todas lotadas numa alegria contagiante, era quando o bairro inteiro se animava pra saudar e brincar o seu padroeiro.
Os Antônios espalhados pelas ruas e avenidas a gente via de longe, nesse dia colocavam uma fogueira na porta de casa, era pra homenagear o santo e a festa continuava, com milho, canjica, bolo, amendoim e claro, muito forró, porque o santo gosta é de animação! Ainda mais sendo ali a sua morada.
Depois que passava os dias de festa do santo ainda vinham as comemorações de Seu João e Seu Pedro, e a festa se estendia até o final do mês, a animação continuava e o santo ainda esfriando na geladeira dos solteiros esperando o desencalhe acontecer pro castigo acabar, coitado de Antônio, trabalhar sob pressão pesada não é fácil!
E o resto do ano transcorria com calma pelas ruas do bairro apadrinhado pelo santo mais querido, de vez em quando ficávamos sabendo da notícia de casamento, e lá íamos todos mais uma vez saudar a união feliz jogando arroz no casal.
No Santo Antônio não faltavam momentos para celebrar seu padroeiro, e até hoje, já adulto, quando chega o dia treze de junho, chega bate um rebuliço no peito, saudades de percorrer aquelas ruas louvando o tão querido Antônio.

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Victor Ramos

iyawo omo oxalá, escritor e roteirista, mestre em cinemas e narrativas sociais (ufs)